Essa medida, embora positiva sob a perspectiva dos consumidores, pode gerar prejuízo às distribuidoras.

O presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei nº 14.385/22, que obriga as distribuidoras de energia elétrica a devolverem aos consumidores créditos tributários (exceto de IRPJ e CSLL) decorrentes de recolhimentos a maior em razão de alterações normativas, decisões administrativas ou judiciais. Essa medida, embora positiva sob a perspectiva dos consumidores, pode gerar prejuízo às distribuidoras pois não considera os custos incorridos por essas concessionárias de serviço público para recuperação de indébitos.

A legitimidade para recuperação de créditos tributários recolhidos indevidamente e a necessidade de repasse do benefício financeiro obtido aos consumidores de energia elétrica é alvo de disputa no Poder Judiciário. Diversas foram as ações propostas por consumidores individuais, associações e pelo Ministério Público pleiteando o ressarcimento de tributos recolhidos indevidamente e repassados aos consumidores nas contas de energia elétrica.

“Essa medida, embora positiva sob a perspectiva dos consumidores, pode gerar prejuízo às distribuidoras”

Após o julgamento do RE 574.706, no qual o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que é inconstitucional a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins, esse tipo de disputa em torno dos créditos a serem ressarcidos pelas concessionárias de serviços públicos se intensificou ainda mais pelas cifras envolvidas. Estima-se que as ações judiciais propostas pelas concessionárias envolvam montante que supera o R$ 50 bilhões.

A própria Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) se posicionou sobre o assunto, defendendo que o benefício econômico deveria ser repassado aos consumidores, na medida em que eles teriam suportado a repercussão dos tributos nas tarifas de energia elétrica pagas nos últimos anos.

Nesse contexto sobreveio a Lei nº 14.385/22, cujo objetivo foi solucionar a disputa jurídica existente em favor dos consumidores e garantir a redução das tarifas de energia. Conforme indicado acima, essa norma obriga as distribuidoras a repassar integralmente aos consumidores os créditos tributários recuperados em razão de recolhimentos a maior. A legislação inclusive autoriza a Receita Federal a realizar o ressarcimento antecipado dos créditos tributários para que o repasse tenha máxima efetividade.

Esses procedimentos, no entanto, ainda não estão claros e, nos termos da referida lei, deverão ser regulamentados pela Aneel. Além disso, chama atenção o fato de o processo legislativo que culminou na Lei nº 14.385/22 ter ignorado diversas questões controversas sobre o ressarcimento e repasse de créditos tributários pelas concessionárias de serviço público, amplamente endereçadas pelos participantes do mercado de energia no âmbito da Consulta Pública nº 5/2021, aberta pela Aneel exatamente para lidar com esse tema.

Dentre essas várias questões, destacamos neste artigo especificamente a falta de dispositivo legal prevendo no mínimo a retenção do suficiente para reembolso dos custos e despesas incorridos pelas distribuidoras para recuperação dos créditos tributários do valor a ser repassado aos consumidores. A inexistência de previsão legal nesse sentido é extremamente prejudicial ao mercado de energia elétrica pois incentiva uma postura inerte, ou conformista, por parte das distribuidoras.

Nem se diga que os custos e as despesas incorridas por essas empresas com as referidas ações judiciais estariam contabilizados no cálculo tarifário vigente, conforme defendido pela área técnica da Aneel. Isso porque não há clareza sedes pesas com ações judiciais discricionárias extraordinárias estariam previstas na formação da tarifa, bem como de todos os demais custos e despesas adicionais incorridos, como a tributação dos créditos tributários, as despesas com advogados e auditores, as custas processuais, dentre outros.

Considerando que os custos e despesas necessários para que seja alcançado o melhor tratamento tributário possível não serão ressarcidos, questionamos qual seria o incentivo das empresas do setor de energia elétrica em disputar judicial ou administrativamente eventuais cobranças tidas como ilegais ou inconstitucionais. Oque as estimulará ou obrigará a adotar uma série de ações, litigar por muitos anos, incorrer em custos extraordinários para, ao final, repassar a totalidade dos ganhos aos consumidores? E no caso de insucesso? Em temas complexos, não há como garantir determinado resultado em uma disputa jurídica.

Assim, do ponto de vista financeiro e gerencial, potencialmente será mais interessante às empresas do setor de energia se manterem inertes do que incorrerem em custos e despesas que não serão recuperados no futuro ainda que haja êxito na demanda. Isto é, não foi criado qualquer tipo de incentivo ou indenização àquela empresa que agiu de forma diligente, em prol do interesse público. Destacamos esse aspecto na oportunidade da consulta pública. Se por um lado não há estímulo, por outro tampouco há punição às concessionárias que não forem diligentes no questionamento de exigências tributárias.

Desse modo, a nosso ver, mostra-se extremamente relevante eventual ajuste na legislação ou a inclusão de dispositivo na regulamentação da Aneel que está porvir tratando expressamente sobre o ressarcimento ou compensação desses custos e despesas incorridos pelas empresas do setor na eventual recuperação e repasse de créditos tributários aos consumidores de energia elétrica.

Fonte: Repasse de créditos pode prejudicar o setor elétrico | Legislação | Valor Econômico (globo.com)

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